Por Fabio Aires da Cunha
Segundo DIAS (1980) e BORSARI (1989), existem indícios de que a prática de atividades relacionada com o futebol ocorre desde a pré-história.
Há mais de trinta séculos, atividades antecedentes ao futebol já eram praticadas no Egito e na Babilônia. Esses jogos deveriam ter um caráter religioso: a bola simbolizando o Sol para os egípcios e a Lua para os babilônios. A bola era uma bexiga de boi inflada de ar. Cerca de 26 séculos antes desta era, na época da dinastia Hsia (Hia), existia um jogo chamado tsu-chu (golpear a bola com o pé), utilizado como treinamento militar da guarda do imperador Huang-ti. Durante a dinastia Han (206 a.C. – 220 d.C.), o jogo se tornou muito popular. Esse jogo era bastante simples: oito jogadores, sem deixar a bola tocar no solo, tentavam passar a bola além dos limites demarcados por duas estacas fincadas no chão e unidas por um fio de seda. A bola era de couro, cheia de cabelo ou crina, tendo 22 centímetros de diâmetro. O campo era um quadrado com 14 metros de lado (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Na mesma época, existia um jogo chamado kemari (ke = chutar e mari = bola) no Japão, no qual os praticantes deveriam manter a bola no alto, para que treinassem sua habilidade com os pés, não havendo assim contagem de pontos. O campo era delimitado por quatro árvores. O jogo era um passatempo da realeza, inclusive alguns imperadores estavam entre os praticantes (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987; UNZELTE, 2002).
Outros achados arqueológicos, datados da mesma época dos chineses e japoneses, atestam que várias civilizações americanas praticavam atividades que se pareciam com o futebol. No Haiti, existia um jogo feito com uma bola de borracha extraída das árvores. Relatos do abade Prévost, já no século XVIII, afirma que os astecas praticavam um jogo chamado tlatchtli, semelhante à péla dos europeus (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Alguns historiadores acreditam que os sul-americanos tenham sido os primeiros a fabricarem bolas de resina para recreação. Os índios da Patagônia praticavam o tchoekah – jogo este parecido com o hóquei –, utilizando um pedaço de madeira para impulsionar a bola. Muitos desses jogos americanos eram praticados com as mãos e talvez por isso não estejam diretamente ligados aos jogos precursores do futebol, assim como os do Oriente (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
No ano de 776 a.C., os gregos criaram um jogo chamado epyskiros, que integrava a educação atlética da juventude helênica, consistindo em disputar, com os pés, uma bexiga de boi cheia de ar, com quinze jogadores de cada lado (UNZELTE, 2002). Os gregos criaram outro jogo de bola, ao qual chamavam harpaston. Os romanos, séculos depois, adaptaram este jogo, criando o harpastum (DIAS, 1980; BORSARI, 1989). O campo era retangular, com uma linha divisória em duas linhas de meta, devendo as duas equipes disputar a bola, com o intuito de atingirem a linha de meta adversária, denominada locus stantium. Essa linha era protegida por jogadores com funções defensivas, como os goleiros e zagueiros de hoje. Na região do campo denominada area pilae pratervolantis et superiectae, atuavam os jogadores mais ofensivos e velozes. Existiam jogadores que permaneciam sobre a linha divisória do campo, a medicurrens, e que jogavam para os dois lados, ora passando a bola para um time, ora para outro (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Os romanos conquistaram muitos povos e ensinaram a estes o seu jogo. Com o domínio romano na Gália e depois na França, o harpastum originou o soule ou choule. Este jogo francês tinha como objetivo fazer a bola passar por entre dois bastões (DIAS, 1980; BORSARI, 1989).
Com relação à Bretanha, existem algumas controvérsias: alguns historiadores acreditam que foram os romanos que introduziram os jogos que deram origem ao futebol, outros acreditam que, quando os romanos chegaram, já existia uma atividade nativa semelhante, de origem lendária e cívica. Os historiadores, entretanto, concordam que os romanos introduziram o harpastum, na Bretanha, que contribuiu para o desenvolvimento dessas atividades (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Na Idade Média e muitos séculos depois, existia um jogo que pode ser o mais importante precursor do futebol moderno. Praticado na cidade de Ashbourne (Inglaterra) e, mais tarde, em várias cidades do condado de Derbyshire, era disputado anualmente entre os habitantes da cidade, por equipes com um número ilimitado de participantes – até 400 e 500 pessoas de cada lado. O objetivo era correr atrás de uma bola de couro e levá-la até a meta adversária, a entrada norte e sul da cidade, uma para cada equipe. Não existem relatos precisos sobre as regras, mas se sabe que os participantes podiam usar as mãos e os pés para conduzirem e dominarem a bola. As origens desse jogo não são muito precisas. Sabe-se que era uma atividade um tanto primitiva, violenta e semibárbara, sendo malvista por muitos (DIAS, 1980; ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987; BORSARI, 1989).
Os ingleses usavam a expressão ludus pilae para definirem qualquer jogo com bola. Alguns historiadores usam esta expressão para indicarem jogos aparentemente inofensivos e outros a utilizam para descreverem passatempos muito conhecidos por suas vítimas. Esse jogo inglês, inclusive, foi o motivo de algumas mortes entre seus praticantes, com alguns requintes de crueldade (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
A grande violência no jogo, a qual não fazia parte das disputas, teve como resultado um ataque por parte do rei e da Igreja. A disputa do jogo foi proibida em Londres, sob pena de prisão. O rei Eduardo II foi quem proibiu a disputa das partidas, mas seu pai, Eduardo I, também temia pela violência do jogo e que seus soldados aderissem a essa atividade e se descuidassem dos afazeres da profissão, isto porque a Inglaterra estava em guerra com a Escócia, iniciada em 1297. Ricardo II, neto de Eduardo III, em 1389, além de manter a proibição, estendeu-a a outros jogos. Na Escócia, Jaime I proibiu, em 1423, que qualquer homem jogasse futebol, com pena de multa. As proibições reais eram reforçadas de tempos em tempos, por Henrique VIII, Eduardo VI e Isabel I. Com isso, o futebol na Inglaterra da Idade Média era uma atividade proibida pelas autoridades. No pátio de algumas igrejas, os padres organizavam jogos com bola, mas isso era restrito a esses locais, pois se condenava o jogo que os londrinos foram buscar em Derby (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Fora da Inglaterra, entretanto, o futebol teve vários praticantes, desde o homem do povo até a nobreza. O soule ou choule francês era muito popular. É verdade que se diga que esse jogo era muito menos violento que o jogo praticado na Inglaterra, não tendo por isso encontrado opositores (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Na Itália, no ano de 1529, estando Florença sitiada pelos exércitos do príncipe de Orange, duas facções políticas resolveram decidir uma velha rixa num jogo de bola realizado na Piazza Santa Croce. Esse jogo entrou para a história, tanto que todos os anos, no dia 24 de junho, nas festividades do dia de São João, padroeiro da cidade, jovens fazem a reconstituição desse jogo, como complemento das festividades (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987; UNZELTE, 2002). O jogo era praticado em uma praça e tinha formação de táticas guerreiras. Cada equipe era composta por 27 elementos, com regras definidas. O jogo foi denominado calcio, nome este que até hoje define o futebol na Itália (DIAS, 1980; BORSARI, 1989). Historicamente é conhecido como o único jogo organizado de toda a Idade Média e Renascença (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Durante o século XVII os jogos de bola passaram por diferentes transformações. Apesar de oficialmente proibido na Grã-Bretanha, o jogo começou a ganhar espaço e essa proibição foi aos poucos se acabando. Este século foi marcado por novas aberturas ao futebol; o rei Carlos II tornou-se o primeiro monarca a autorizar a prática do futebol, fato este ocorrido em 1660, quando permitiu que seus criados enfrentassem os do duque de Albermale (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Já no século XVIII, os jogos com bola começaram a fazer parte da educação de muitos jovens nas escolas. Os jogos, antes violentos e proibidos, passaram a ganhar um novo caráter e a integrar o cotidiano de muitas escolas. No início do século XIX, Thomas Arnold (1795-1842) reformou todo o ensino superior inglês, dando grande importância para as práticas esportivas na educação dos jovens, e o futebol, então, passou a ser uma das primeiras atividades introduzidas nas escolas públicas em caráter oficial (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Na primeira década do século, muitos locais praticavam o futebol e algumas regras começavam a surgir. O futebol até então permitia o uso das mãos apenas para reter a bola alta e logo em seguida colocá-la no chão. O rugby foi introduzido em 1823, após William Webb Ellis desrespeitar as regras ao pegar a bola com as mãos e carregá-la até a linha do gol. Este marco foi importante para definir o caminho dos dois esportes. A mais antiga das regras é a de Rugby, instituída em 1846 (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Em 1848, surgiu a regra de Cambridge, que proibia carregar a bola com as mãos. Os jogos intercolegiais tornaram-se freqüentes a partir de 1855, mas Rugby continuava a praticar sua atividade diferenciada, internamente. Alguns anos mais tarde, os dois tipos de futebol foram separados (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
As primeiras regras eram semelhantes, mas não iguais; diferiam em alguns aspectos. Em função do espaço, as dimensões do campo e o número de jogadores (17, 15, 11 ou 8) variavam muito. O número de 11 foi o que mais se adaptou, pelo fato de que em Cambridge as turmas tinham 10 alunos e 1 bedel. As bolas também mudaram muito, ora redondas, ora ovais (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987). Com o surgimento de clubes, o jogo começou a ter um desenvolvimento maciço. Em 1860, o football tentou tornar-se um esporte com a criação de alguns campeonatos. Em 26 de outubro de 1863 (data oficial de nascimento do futebol moderno), numa histórica reunião em Londres, criou-se a “The Football Association” (GARCIA; MUIÑO; TELEÑA, 1977; DIAS, 1980; ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987; BORSARI, 1989).
Com a criação da entidade, passou-se a discutir a uniformização das regras. Foi decidido que as regras definitivas deveriam ser baseadas nas regras traçadas por Sheffield (1857) e Cambridge (1862). O objetivo era tornar o jogo atraente e civilizado, condenando qualquer ato que induzisse à violência, como o tranco e o corpo-a-corpo. Algumas reuniões foram feitas para uniformização das regras, com algumas divergências, inclusive com alguns que queriam a permissão do uso das mãos. A 8 de dezembro de 1863, foi aprovado o código constando um total de treze itens. O futebol praticado naquela época era muito diferente do praticado no dias de hoje. Suas regras foram se modificando até chegarem a um total de dezessete e apresentarem a característica atual (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
As primeiras táticas eram bem ofensivas, isto quer dizer, todos no ataque. Com o passar do tempo, alguns atletas foram deslocados para o meio de campo. Com o surgimento da regra do impedimento em 1865, atletas passaram a atuar na defesa. A figura do goleiro autorizado a pegar a bola com as mãos surgiu em 1871 (DIAS, 1980; BORSARI, 1989).
O futebol começou a ser difundido por toda a Inglaterra e Ilhas Britânicas. Em 1871, teve início a disputa da Taça da Inglaterra, hoje a mais antiga competição de futebol e uma das mais antigas de todos os esportes (UNZELTE, 2002). Em 30 de novembro de 1872, Escócia e Inglaterra se enfrentaram no primeiro jogo entre seleções nacionais. O jogo terminou empatado sem gols. Com a fundação das entidades nacionais de Escócia, País de Gales e Irlanda, o futebol começou a tomar um impulso mundial. Em 1882, as regras foram uniformizadas no Reino Unido, e no ano seguinte, realizou-se o primeiro Campeonato Britânico, vencido pela Inglaterra. Em 1886, as quatro entidades criaram a The International Football Association Board, entidade esta que regulamenta as leis do jogo, em cooperação com a FIFA (Fédération Internationale de Football Association) até hoje (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
Os ingleses se encarregaram de difundir o futebol pelo mundo. Levaram o esporte para a Argentina (um dos primeiros países fora do Reino Unido a praticar o futebol), Alemanha, Portugal, França, Dinamarca, Países Baixos, Suíça e outros (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987).
DUARTE (1994) e UNZELTE (2002) relatam que no início do século XX, o futebol começava a se organizar. Existiam federações nacionais, mas não existia uma federação internacional que pudesse controlar as relações entre as federações nacionais. Após a iniciativa do holandês Carl Anton Wilhelm Hirschmann, que em 8 de maio de 1902 redigiu um estatuto que regeria as relações futebolísticas, a federação inglesa, a mais antiga e tradicional, aprovou a idéia e colocou em prática a organização da federação internacional. Em 21 de maio de 1904, era criada a FIFA. Hirschmann continuou tendo uma participação importante, pois foi ele que redigiu todos os regulamentos da nova entidade. O francês Robert Guérin foi escolhido como o primeiro presidente. Os sete países fundadores foram França, Bélgica, Espanha, Suíça, Países Baixos, Dinamarca e Suécia. No ano seguinte, incorporou-se à entidade, Alemanha, Áustria, Itália, Hungria e Inglaterra (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 1987; DUARTE, 1994). Pela primeira vez falou-se em um Campeonato Mundial. Foram abertas as inscrições, mas nenhum pretendente. Hoje a disputa para ser a sede de um mundial é imensa (DUARTE, 1994).
De acordo com DUARTE (1994), a I Guerra Mundial foi o grande obstáculo para o esporte entre 1914 e 1919. Na década de 20, surgiu novamente a idéia do Mundial. Com a eleição de Jules Rimet, para a presidência da FIFA, teve início uma nova fase para o futebol mundial. Quando deixou a entidade, em 1954, esta tinha 85 filiados. Para quem assumiu com 20, foi um fato notável, além do francês ser o realizador do primeiro mundial.
Os torneios olímpicos de futebol começavam a ganhar um grande destaque. Em 1924, o Uruguai surpreendeu mostrando aos europeus como se praticava o esporte na América do Sul. Repetiu o fato em 1928, ganhando a medalha de ouro (DUARTE, 1994). A 28 de maio de 1928, no Congresso de Amsterdã, Jules Rimet e seus companheiros decidiram a realização do I Campeonato Mundial. Ficou estabelecido que esse torneio se realizaria a cada quatro anos e que o primeiro seria realizado em 1930 no Uruguai, como homenagem às suas conquistas olímpicas em 1924 e 28 (UNZELTE, 2002).
Após o início muito tumultuado, a Copa do Mundo tornou-se a competição de uma modalidade esportiva mais importante do mundo, chegando inclusive a ter mais países filiados à FIFA do que a própria ONU (Organização das Nações Unidas). O sucesso dos mundiais é incontestável, milhões de espectadores assistem às competições. Foram realizadas 17 Copas do Mundo: 1930 (Uruguai); 1934 (Itália); 1938 (França); 1950 (Brasil); 1954 (Suíça); 1958 (Suécia); 1962 (Chile); 1966 (Inglaterra); 1970 (México); 1974 (Alemanha); 1978 (Argentina); 1982 (Espanha); 1986 (México); 1990 (Itália); 1994 (Estados Unidos); 1998 (França) e 2002 (Coréia do Sul e Japão), sendo este último o primeiro torneio realizado em dois países simultaneamente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BORSARI, J. R. Futebol de Campo. São Paulo: E.P.U., 1989. Cap. 1, p. 11-14.
DIAS, D. S. Futebol Total. Juiz de Fora: [s.n.], 1980. p. 3-10.
DUARTE, O. Todas as copas do mundo. São Paulo: Makron Books, 1994. 584 p.
ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA. O Futebol. In: Enciclopédia Mirador Universal. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil, p. 5030-5060, 1987.
GARCIA, C. M.; MUIÑO, E. T.; TELEÑA, A. P. La Preparación Física en el Fútbol. Madrid: [s.n.], 1977.
UNZELTE, C. O Livro de Ouro do FUTEBOL. São Paulo: Ediouro, 2002. 696 p.